domingo, 24 de outubro de 2010

Mochilão Bolívia, Peru e Chile


Do imaginário para a realidade...

A ideia do mochilão com meu primo Eduardo surgiu num bate-papo inocente lá pelos primeiros meses de 2010 em Marechal Rondon... vontades convergiram para a mesma direção: conhecer Machu Picchu. Meses depois começamos a conversar de verdade para saber se a ideia sairia mesmo do papel.

E começou a sair... a primeira providência foi investigar como era o funcionamento da trilha inca, já que seria a maneira mais divertida de chegar à Machu Picchu. Fizemos a reserva com uns 3 meses de antecedência – período mínimo pra conseguir vaga – e começamos a pensar na viagem como um todo: como ir, voltar, deslocamentos por lá e quais lugares conheceríamos. Inicialmente pensamos em 10 a 15 dias de viagem, mas então comecei a pesquisar sobre as cidades do Peru e da Bolívia que poderiam ser visitadas nesse período e adivinha? Me empolguei... olhava o mapa e pensava: “podemos ir à essa cidade... e àquela outra também... e essa ali é tão perto... e essa já vai estar do lado...”. Já viu né? A viagem de 10 acabou ficando em 32 intensos e inesquecíveis dias de aventura.

O período de planejamento da viagem é uma das partes mais deliciosas de viajar. Você fica imaginando como serão os lugares, os dias, as pessoas... como será estar nos lugares que agora você só conhece por foto... 

Este blog criei quando voltei do mochilão para contar as aventuras, sugerir passeios e auxiliar de alguma maneira os próximos mochileiros, pois antes de viajar também li muito sobre os lugares e peguei informações com pessoas que já conheciam os destinos... Aqui também tem o roteiro resumido da viagem, os gastos, o check list de tudo que foi levado e os diários (claro) com as principais atividades de cada dia.

No blog todo o mês de 'outubro' está destinado aos diários da viagem. Aproveite e explore...

"Não quero viver pela mera certeza de minha existência. Quero existir intensamente pelo tempo que me couber." Cheila.

E o mochilão definitivamente saiu do papel...

1º Dia (09/08/10) - O início de tudo...

Mochilas prontas e lá vamos nós...

Na noite anterior da viagem uma conferida minuciosa nos itens indispensáveis: passaporte, dinheiro, cartão, guia e câmera fotográfica. Pronto! Com o resto a gente poderia se virar.

O mochilão teve início saindo de Cascavel (por questões logísticas e financeiras) às 7h30min pela Trip com destino a Corumbá-MS. Um voo meio maluco com escalas em Londrina, Maringá e Campo Grande. Chegamos no destino às 13h.


Para nos resgatar no aeroporto e levar até a estação de trem em Puerto Quijarro contratamos o Ney (ney-operadortur@hotmail.com / 67 – 3231-8989 / 67 – 9280-3823) - é um cara facilmente encontrado na net (orkut por ex.) que compra passagens antecipadas para o Trem da Morte e ajuda a galera mochileira a iniciar o tour pela Bolívia. Serviço aprovadíssimo: nos buscou, levou pra almoçar num restaurante, esperou nas aduanas da fronteira (primeiro carimbo no passsaporte... êêê), levou pra cambiar dinheiro e nos deixou na estação com as passagens compradas com boa antecedência pra ficarmos sossegados.


Aliás nossa antecedência foi tanta que acabamos levando um chá de cadeira na Estação, mas a opção foi nossa pois ficar circulando por lá não nos pareceu muito interessante (ou seguro).


Trem da Morte
Para andar no lendário Trem da Morte, você tem três opções: o pullman, o super pullman e o ferrobus. Seguindo as dicas de outros mochileiros (a não ser que você esteja viajando no limite da grana) não pegue o pullman pois parece que o negócio é meio caótico.
Por causa da data que chegaríamos (segunda-feira) só tinhamos a opção do Ferrobus, pois então lá fomos nós. Como pegamos a opção mais xiqui, o espaço nas poltronas e o serviço foram excelentes. Muito longe do que um mochileiro espera... mas com coisa boa a gente acostuma rapidinho.


TREM
CLASSE
DIAS
HORÁRIO SAÍDA
HORÁRIO CHEGADA
VALOR (Bs.)
Ferrobus
Cama ou Semicama
Lunes – SEG, 
Miercoles - QUA, 
Viernes - SEX
19h
8h50min +1
257
222
Expreso Oriental
Súper Pullman
Martes - TER,
Jueves - QUI,
Domingo
16h30min
8h40min +1
127
Regional
Pullman Primera
Lunes a Sábado
12h45min
09h25min
+1
115
52

À noite teve janta: uma marmita com frango e arroz que eu devorei pois estava morrendo de fome. Na TV (tinha até tv) passou uns dois filmes sanguinários e eu capotei de sono com minha almofadinha inflável - um dos luxos que levei e não me arrependo pois é compacta, leve e dá uma ajudinha e tanto para o pescoço nas noites e noites dormidas nos ônibus.

2º Dia (10/08/10) - Sta.Cruz de la Sierra - La Paz

Santa Cruz (só de passagem...) e La Paz

Santa Cruz é  a segunda maior cidade da Bolívia, com mais de 1,5 milhão de habitantes e é o coração financeiro do país. Uma cidade bem diferente das demais que conhecemos na Bolívia, o caos urbano não é tão grande (apesar do trânsito seguir os padrões bolivianos... uma loucura), você não encontra as famosas cholas pela rua - é mais fácil encontrar gente engravatada... e o comércio informal tãããão comum em La Paz, bom, esse nós nem encontramos por lá.

La Paz... ahhh La Paz... muitos brasileiros (e outros turistas) que encontramos por lá não gostaram da cidade. Eu?? A-M-E-I!!! Voltaria pra lá muitas outras vezes. Aliás quero voltar sim. A cidade é um show a céu aberto da cultura boliviana. Muito além do que eu poderia imaginar. A capital do país guarda uma riqueza inestimável: seu povo. Com fortes raízes indígenas, a população simples de La Paz impressiona pelo apego às tradições... e as 'cholitas' então, ah elas são composição obrigatória no cenário boliviano. As cholas são mulheres místicas, trabalhadoras e silenciosas que mantem vivas as vestimentas de seus antepassados: tranças nos cabelos, vestido de rendas com muitas camadas, chapeuzinho típico e um pano colorido nas costas com um nó amarrado no pescoço, geralmente carregando uma criança ou mantimentos. Mas deve ser esse grande contraste que faz as percepções serem tão diferentes: se uns amam a história, as montanhas nevadas, as belezas naturais e os hábitos desse povo, outros se incomodam com a pobreza, o comércio na rua, o trânsito caótico e a falta de higiene. Como diz o guia, assim é La Paz: sem meios termos.

Amanhecemos com um bom (dentro do possível) café da manhã servido no Trem da Morte. A chegada em Santa Cruz de la Sierra (9h) deu um frio na barriga. Tinhamos um roteiro e um problema: o primeiro destino que seria Potosí estava em conflito, guerrilha e com tudo bloqueado - por reivindicações diversas os manifestantes fecharam toda a região: ninguém entra, ninguém sai. Inclusive turistas ficaram isolados por lá.


Bom, sem a menor perspectiva de liberação alteramos todo nosso roteiro e pegamos um taxi (bs.15) até a agência Panorâmica. Com receio de que não desse tempo de fazer tudo que foi programado compramos uma passagem aérea (não prevista: bs.620) até La Paz para chegarmos ainda hoje na capital boliviana.

Como o voo só sairia à tarde, aproveitamos o tempo disponível para conhecer um pouco da cidade que, aliás, não oferece muito aos visitantes. Fique por lá somente o tempo necessário. Fomos à Praça 24 de setembro, onde está Basílica, subimos no mirante, tiramos umas fotos, vimos umas revoadas dos pombos e pegamos o taxi rumo ao aeroporto de Viru Viru (bs.60).

 

Ah, ainda lá na cidade compramos as famosas Soroche Pills por bs.3 cada - são comprimidos para prevenir os problemas com a altitude. Na verdade os comprimidos são à base de Ácido Acetil Salicílico, o famoso AAS. Mas como a preocupação com os males da altitude eram grandes e não sabíamos como nosso organismo reagiria, tomamos um comprimido pra garantir.


O aeroporto oferece boas (e caras pros padrões bolivianos) opções de refeição, comi um super sanduíche aberto com batata frita e suco. O voo de uma hora para La Paz foi tranquilo e surpreendente, pra quem nunca tinha visto a Cordilheira dos Andes, vê-la do alto foi inesquecível.


Chegamos às 15h20min no aeroporto em El Alto - uma uma cidade de mais de 1.000.000 de habitantes no altiplano andino, colada em La Paz. De imediato a sensação: o ar estava um pouquinho menos respirável, mas absolutamente nenhuma dificuldade maior. El Alto é outra atração: a cidade é um caos, rs.

No caminho até o Hotel Condeza (indicado pelo taxista) a visão de La Paz me fez perder o fôlego: uma cidade enorme toda em tijolinhos marrons, num grande vale com montanhas nevadas ao fundo! Nossos suspiros fizeram o taxista parar para tirarmos fotos. Fiquei extasiada, achei o máximo aquele cenário.


O hostel Sagarnaga que queríamos ficar estava sem disponibilidade para o período que precisaríamos e além de tudo era mais caro que o Hotel Condeza. Optamos pelo Condeza (diagonal Juan XXIII, 190 - entre Illampu e Linares) e foi uma ótima escolha: bons quartos, banheiro privativo, ducha quentíssima com aquecimento à gás, TV a cabo, elevador e o recepcionista mais simpático de toda viagem...


Fomos comprar água, frutas e empanadas pra forrar o estômago. Como eu não tinha muita roupa 'técnica' de frio, fui na loja da Tatoo na calle (rua) Illampu e aproveitei a vantajosa diferença no câmbio pra comprar 2 blusas polares, uma luva decente e mais uma underwear (usei muito todas as aquisições durante a viagem). Um bom investimento.

À noite jantamos no Luna, na calle Sagarnaga. Um restaurante evidentemente pra turistas, então aproveitamos nossa condição (de turistas) e experimentamos os pratos locais. Pedi uma lasanha de lhama e meu primo foi de filé de lhama. Apesar de linda e cheirosa, a lasanha estava quase que insuportavelmente forte. O tempero era de arder a alma. Consegui comer metade, o resto ficou pra contar a história... hehe. Pra beber, um licuado (suco) de tumbo - excelente.

3º Dia (11/08/10) - Chacaltaya

Subida à montanha Chacaltaya

Chacaltaya é uma montanha a mais de 5.300 metros de altitude na Cordilheira Real e não há maneira mais fácil de se chegar a uma altitude dessas. Nela está a estação de esqui mais alta do mundo, porém está desativada pois o nível de gelo e neve diminuiu 80% desde 1963. Você chega até a sede da estação de esqui de van ou ônibus e segue o trecho até o cume caminhando. Ainda assim a visão lá de cima impressiona, é possível avistar La Paz, outras montanhas (entre elas Huayna Potosí bem ao lado) e lagoas das mais diversas cores.

Café da manhã no hotel e primo tentou tomar café, porém era tão grosso e forte que manchava a colher, xícara, boca e dentes. Impossível. Só depois descobrimos que aquilo não era o café pronto, era um 'concentrado' ao qual você deve acrescentar água... hauahauahua

Pois bem, contratamos alguns passeios com a Agência Azymut (recomendo pois fomos muito bem atendidos, o inconveniente é que não aceitam cartão - aliás, isso não é tão comum por lá) e o primeiro deles era para o Chacaltaya. Nos pegaram no hotel e lá fomos nós... Fizemos uma parada em El Alto a 4.000 m de altitude, no local onde as bruxas fazem os rituais com oferendas e tudo mais.


Leve comida pois o almoço é com o que você tiver, mas se esquecer não se preocupe, eles fazem uma parada numa 'mercearia' onde você pode comprar alguma coisa. Como estávamos levando empanadas, aproveitei o stop para comprar caramelos de coca para a altitude... sempre ela.


No caminho ao pico uma parada para tirar fotos do Huayna Potosí (ainda sem saber que seria a montanha que escalaríamos semanas depois). Ao sair do ônibus, o vento quase me jogou pro outro lado... um vento cortante, o frio pegou. Voltei correndo pra colocar touca, luvas e fechar bem a jaqueta. A subida no ônibus até a base da estação de esqui é uma emoção à parte: curvas malucas me fizeram pensar se não seria melhor ir a pé. Mas o cenário me fez esquecer de qualquer coisa: vista dos picos nevados, gelo pelo caminho, lagos azuis. Simplesmente LINDO!


Colocamos todas as roupas e subimos. Esse trajeto foi outra coisa maluca, o vento era tão forte e o frio tão intenso que subimos de braços dados pra dar conta do recado. O rosto congelou. Muita manteiga de cacau, mas engraçado como não dava pra sentir se tinha passado o suficiente ou não.


A visão do Huayna Potosí é maravilhosa. Foi bastante cansativo subir até porque ainda estávamos nos aclimatando à altitude, faltava ar mas o vento era algo absurdo. Mas... e daí? Tirei um monte de fotos, curti o visual e me senti viva, feliz e aproveitando a vida!


Depois voltamos à La Paz e atravessamos a capital todinha até chegar na zona sul onde está o Vale da Lua. Quer uma descrição? Hmmm... Eh... Bem... Posso dizer que é... legalzinho. Ok, vamos lá: se você não tiver nada pra fazer e se o passeio estiver incluído (o nosso estava), faça. Caso contrário, deixa quieto. É um lugar que não tem muuuito o que ver e fazer. Há um caminho demarcado e você circula por uns trechos com uns pequenos abismos ao lado e só. Mas de qualquer maneira é uma paisagem bastante diferente de tudo que vemos no Brasil, valeu a ida.


De tardezinha arriscamos um lanche local e comemos no Pollo Rey, bem bom. À noite comemos no La Mia Pizza, na calle Illampu, muito bom. Melhor ainda é o preço de tudo na Bolívia, essa pizza grande mais dois sucos saiu por bs.54, cerca de R$ 13,00. Adoooro!

Ah hoje também aproveitamos pra conhecer o Mercado de Las Brujas que fica na calle Linares e na Santa Cruz, a venda de produtos assussta um pouquinho.. tentei registrar, mas elas não gostam muito se você não compra nada e eu não tinha a intenção de trazer um feto de lhama pra casa...

4º Dia (12/08/10) - Tiwanaku

Complexo Arqueológico Tiwanaku

À 72 quilômetros de La Paz, esse sítio arqueológico remonta à história da cultura Tiwanaku, que ocupou o altiplano andino por mais de 3 mil anos e as ruínas ali presentes são o maior exemplo arquitetônico da América do Sul pré-inca. Na visita ao museu você se depara com um grande monolítico, peças cerâmicas, ossos, diversos objetos arqueológicos e até um corpo demonstrando como eram realizados os enterramentos em posição fetal e tudo, porém por toda parte interna do museu não é permitido tirar fotos.

Nosso passeio cultural teve início às 8h30min: o guia nos pegou no hotel e seguimos por 1h30min de viagem até as ruínas. Pelo caminho uma infinidade de pequeninas comunidades isoladas, fiquei imaginando se conseguiria viver num lugar como aquele.

Ao chegar no Complexo Arqueológico de Tiwanaku tivemos explicações sobre essa cultura pré-inca e como não era permitido tirar fotos dentro do museu, os registros ficaram na memória mesmo. Dentre as inúmeras informações passadas, algumas marcam mais e ficam fresquinhas, como o fato de que as crianças dessa civilização eram selecionadas quando muito pequenas: aquelas que começassem a falar e caminhar mais precocemente eram as escolhidas e lhes era aplicada a deformação craniana, onde algumas áreas do crânio eram pressionadas através de faixas de pano. Esse ritual era feito pois acreditavam que então essas pessoas cresceriam com mais neurônios que os demais membros da civilização.


Na sequência visitamos todo o complexo, com as didáticas explicações de nosso guia. Um passeio muito bacana de se fazer, principalmente se você tiver um guia que colabore com sua compreensão daquele espaço. A porta do sol com seu completíssimo calendário, os monolíticos do sábio, as cabeças, os lugares de sacrifício...


O que deixou a desejar mesmo foi o almoço... de entrada uma sopa de quinua (essa tava boazinha), mas de segundo veio uma carne de lhama que foi sofrível. Estava meio crua e aí viva a batata frita ensopada no óleo!

Voltamos à La Paz e aproveitamos para conhecer a Catedral e o Palácio Legislativo na Praça Murillo. O fato tão inusitado quanto estranho que ocorreu nesse trajeto e merece destaque aqui é o pó misterioso jogado no meu primo. Atravessamos a confusa e caótica Av. Mariscal Santa Cruz e ao chegar na calçada do outro lado que estava tão cheia de gente quanto a avenida de carros, alguém no meio da multidão jogou um pó branco em cima do Edu que, de imediato, parou para limpar a blusa, cabeça e cabelo. Percebendo que ele havia se distanciado voltei e vi ele se limpando. No mesmo momento um jovem boliviano parou para auxiliar, perguntou o que havia acontecido, se demonstrou bastante preocupado e nos disse que qualquer problema deveríamos ligar para a polícia, falou os números que poderíamos ligar e tudo mais. Achei a preocupação do boliviano tão estranha quanto o pó jogado. Enfim, roupas limpas continuamos andando e comentando sobre o ocorrido. Como não vimos quem jogou nem deu tempo de reclamar ou coisa parecida. Mas achamos estranho. Até pensamos em feitiço e essas coisas de bruxas já que em La Paz isso é muito comum, mas acabou virando riso o tal 'pó de pirilimpimpim'. Tudo bem até que na volta ao hotel meu primo sente falta da sua câmera fotográfica que estava no bolso (do joelho) da calça. Putz, e agora? Agora a preocupação do rapaz boliviano pareceu fazer mais sentido... Não podemos afirmar com certeza se o pó serviu para distrair a atenção enquanto a câmera era levada rapidamente em meio ao tumulto ou se ele esqueceu em algum lugar e isso tudo não passou de uma incrível coincidência. De qualquer maneira sua Canon novinha estava 'perdida' e não tinhamos muito o que fazer. Então fica aí o aviso: tome muito cuidado com seus pertences ao circular pelas ruas da capital boliviana, não dê bandeira e esteja atento em momentos de aglomeração de pessoas (sempre há, principalmente para atravessar as avenidas).



Na janta optamos por voltar ao Luna para comer coisas mais 'normais' pra nós, já que o almoço tinha sido meio difícil. Fui de omelete mesmo e o Edu foi de creps.

5º Dia (13/08/10) - Downhill em Coroico

Bike em Coroico

O downhill até Coroico é uma das maiores atrações de aventura de La Paz...Você desce de 4.650m de altitude até 1.200m, em 65 quilômetros de pura e veloz descida. A estrada conhecida como 'Estrada da Morte' faz jus ao nome, vários ciclistas já morreram por lá. Você vai de van até a cidade de La Cumbre e inicia o trecho pelo asfalto, depois pega uma estrada de terra mais 'larga' e depois o trecho estreita bastante nas curvas alucinantes até chegar em Yolosa. Há sempre um guia na frente e outro atrás para acompanhar o grupo que, invariavelmente acaba se dividindo: os mais pirados vão se jogando nas curvas e compõem o pelotão da frente e os mais 'normais' seguem uma descida mais sã, menos veloz.

O 5º dia de viagem foi intenso... Saímos às 6h50min e tomamos café no Hostel El Solario que é do grupo que operacionaliza o tour. Os equipamentos e as roupas foram entregues. Me deram um capacete tão grande (daqueles de motocross) que eu pedi outro, mas o guia me disse que quando chegassemos lá no início da descida verificaria se havia outro. No nosso grupo argentinos, uma família de franceses e dois brasileiros.


De van fomos até os 4.650 m de altitude com o tempo fechando e até gelo pelo caminho. Na parada para pegar as bikes e iniciar a descida começou a nevar! Uau, que bacana! Como o frio estava grande fiquei com aquele capacete monstro mesmo e após as instruções do guia iniciamos o percurso. Ao longo do caminho umas cruzes elucidaram o nome do lugar: Estrada da Morte. O começo é por uma estrada asfaltada, depois pegamos outra estrada de terra e finalmente a parte mais power com um caminho mais estreito, curvas em 'V' e o abismo logo ali ao lado.




Não tinha a intenção de andar mega rápido, mas a adrenalina daquela descida me fez um tanto quanto insana e usei toda habilidade possível pra vencer as curvas malucas a uma velocidade insólita. Junto com a galera da frente que andava colada e quase atropelando o guia, curti o visual do lugar: de montanhas nevadas à densa floresta. E o aroma? Ah, aquele que só as matas têm. Me lembrou muito o trecho da serra da Graciosa no leste do Paraná, tanto pelo visual delicioso quanto pelo ar puro.


 

Tudo muito lindo, tudo muito maravilhoso, mas a aventura estava à mil. A descida agitou o corpo todo. Excitação grande a cada curva vencida naquela velocidade, e lá vinha outra e mais outra até que... AAAAAAAAAAAAA! O francês da minha frente freiou demais na curva, fiquei com medo de bater nele, joguei a bike pro lado e: Vou vencer a curva... Não... Não vou... Vou... Não vou... Nããããão. Não venci a curva. As pedras enormes da saída da curva me fizeram perder o controle e fui absoluta e completamente de cara no chão. Meu primo vindo logo atrás já parou pra me socorrer: "Prima, você tá bem?". Eu que num reflexo doido já tinha me levantado: "Tô, tô bem". E dois segundos depois: HAHAHAHAHAHAHA. Morremos de rir.

Morri de rir, mas estava morrendo de dor também, rsrs. Meus dedos da mão direita doíam bastante e o pior é que eu precisava utilizá-los o tempo todo para o freio. Sentia dor na palma da mão esquerda e algo na minha perna esquerda também, mas mandei ver, continuei sem pensar muito até a parada para o lanche. Na parada (que foi a segunda de todo trajeto) tivemos sanduíche de queijo de lhama, refrigerante e água. Lá dei uma olhadinha e vi que mesmo com a luva os dedos tinham cortado, mas o que doía era a pancada, estavam inchados. O capacete entortou na frente e a bike tava meio tortinha, mas tá valendo.



Quase chegando ao destino final vejo uma menina parada sendo atendida: chorando, as pernas e braços todos esfolados (estava de shorts e camiseta curta). Nessa hora tive a certeza de que estava usando a roupa e os equipamentos certos. E a frase que li no Guia do Viajante sobre esse passeio ressoou na minha mente: Não economize com a sua segurança! Fica como elemento indispensável pra quem pretende fazer o downhill: Não queira pagar um pouco menos e usar equipamentos não tão seguros porque 'nada acontece com você'. Garanta sua segurança para curtir a emoção do tour, digo isso pois, se eu estivesse usando o capacete pequeno - aquele que não é fechado até o queixo (que, aliás eu queria no início do passeio) teria me machucado pra caramba. De cara no chão, naquela velocidade e àquela altura, certamente eu teria arrebentado minha cara (mandíbula, dentes, nariz e tudo mais) e ainda acabado com o resto da viagem. Por isso não pense duas vezes: Não economize com a sua segurança! Isso pode sair bem caro.



Na finalera da descida chegamos em um hotel com piscina e sabe o quê? Banho. E com água quente. Recuperados, limpos e famintos, devoramos um almoço muito bom. Ah, então agora é só a volta. A emoção acabou. Que nada... o retorno com a van naquelas mesmas curvas em 'V', com o abismo do lado e um espacinho pequeno pra passar foi tão emocionante quanto descer. A diferença é que descendo você tem o controle da situação. Havia muita neblina e não se enxergava quase nada, deu um frio na barriga.


Chegamos em La Paz às 19h e a agência nos presenteou com um CD com as fotos e uma camiseta escrito "Eu percorri a estrada da morte e continuo vivo". Hahaha, divertida. No hotel depois vi o tamanho do roxo na minha perna: do tamanho de uma manga, uma bem grande, rsrs. (Ps. já faz mais de 60 dias dessa queda e o roxo ainda não sumiu completamente). A foto abaixo dá uma noção da cacetada... hehehe. Janta na calle Illampu mesmo, numa pizzaria pertinho da calle Sagarnaga. Muito boa.